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terça-feira, 30 de novembro de 2010

Chez Georges, Paris

Na minha recente temporada em solos franceses, cheguei por lá munido de uma lista (nada pequena...) de bistrôs a conhecer.
Tem sido assim.
Eu passo o ano estudando a França... Livros, internet, amigos do ramo (chefs de cuisine e alguns locais...) enfim, quando chego por lá, a lista é sempre grande. E ela vai acumulando a cada ano porque eu não consigo "cumprir" nem de longe a minha "meta".
Pra você ter uma ideia, dessa vez a lista contava com cinquenta e nove bistrôs só em Paris.
Bem, é claro que em cinco dias na cidade, seria mesmo impossível essa tarefa.
Mas tudo bem, vou peneirando aqui e alí e passo o pente fino. Cinco deles eu teria que ir... Questão de honra e profissionalismo.
O Chez Georges foi um dos cinco. Ainda bem.
Já fazia um tempo que ele tava na minha lista e, por alguma (feliz) razão, dessa vez ele não me escapou.
Quando eu digo que "estudo" a França e seus bistrôs, meu trabalho não é apenas anotar os nomes e endereços dos mesmos. Eu leio o menu, procuro saber os pratos mais interessantes de cada casa, vejo relatos de quem já provou o prato tal, e se possível, tento conhecer um pouco da história do chef que comanda a casa em questão.
Coisa de profissional mesmo, pardon.
Então você não imagina a minha felicidade, quando chega o tão esperado momento que eu sento à mesa acompanhado da minha querida Camîlle Flottante e orquestro todos os pedidos.
eggs mayo
A entrada que dividimos (e quase houve briga...) tinha que ser os "Oeufs Mayonnaise".
Essa iguaria já estava escolhida antes mesmo de eu comprar as passagens para a França.
Eu gosto de ovos. Acho que a galinha existe pra isso... Por mim a galinha viveria muito mais (dispenso a carne da ave..) e quando os ovos encontram uma maionese maison de primeira, aí a coisa fica séria.
mille-feuille
Escolhi para Mme Flottante uma belíssima carne que, a julgar pela performance da francesa da mesa ao lado, enquanto fingia prestar atenção no monótono assunto do casal a sua frente, devorava a dita cuja com a seriedade de quem não come a dois dias, já dava pra perceber... Estávamos no caminho certo.
O "Coeur de Filet Grillé Bearnaise" fez bonito, mas foi com a sobremesa que Camîlle se emocionou... Que mil folhas (!!!)... Faz toda a diferença o croquant da massa e o crème vanille quando falamos de um verdadeiro "Mille-Feuille".
sole georges
O "Sole Georges" também bem já havia sido escolhido praticamente dois meses antes da viagem.
Eu, amante do linguado das águas do Atlântico norte, comi de joelhos.

Chez Georges
1, rue du Mail 75002
tel: 33(01)4260-0711
métro: Bourse

domingo, 28 de novembro de 2010

La Mère de Vinaigre

Esse mundo da gastronomia é um eterno aprendizado. Veja por exemplo que interessante essa história que aconteceu recentemente comigo.
Estava num almoço de domingo na casa da minha elegante sogra quando M. J. , uma amiga querida, me surpreendeu com a seguinte pergunta:
_você conhece a mãe do vinagre?
_mãe de quem?
_do vinagre
_ué... mas não é o vinho? Ah, mas aí seria o pai.. Hum, não conheço.

Devo ter ficado com uma cara de ponto de interrogação no meio da testa, mas M. J. com toda a propriedade de quem sabe o que está falando, me contou a deliciosa história de como um bom vinagre deve ser feito:

"A fabricação do vinagre, produto da acetificação, pode ser artificial ou natural, resultado da fermentação do vinho ou de outras soluções alcoólicas. O depósito da fermentação, concentrado ao longo do tempo em membrana gelatinosa, cuja espessura se adensa na superposição de novas camadas gelatinosas, folha sobre folha, era retirado pelos produtores de vinagre a fim de fermentar os tonéis destinados ao vinagre. Nas regiões vinhateiras, a "mãe do vinagre" (nome pelo qual é conhecida a concentração dos micodermas da fermentação - Mycoderma aceti) é passada de pai a filho depois que se proibiu, na França, a fabricação do vinagre pelos produtores de vinho."

Veja só... Não é bem a cara da França isso? Tudo é muito protegido, controlado e respeitado.
O champagne só pode ser chamado de champagne quando ele é produzido na região de Champagne. Com o conhaque acontece o mesmo.. Só quando é feito na cidade de Cognac, e por aí vai.
Quem produz vinho não deve atrapalhar a vida de quem vive de produzir o vinagre. Assim é a França. Eu acho o máximo isso.

Continuando a história:

"A mãe do vinagre é um cogumelo, um fungo, um ser vivo, portanto. E requer cuidado. Quem o cultiva, torna-se seu protetor. A grande alegria é poder, com o correr do tempo, oferecer aos amigos os 'filhotes", isto é, as folhas gelatinosas que irão produzir mais vinagre, per omnia saecula, saeculorum."

Que lindo isso: "para sempre, eternamente, até o fim dos tempos..."
Depois de toda essa explicação, ma chérie M. J. me presenteou com uma linda "mère de vinaigre" original da região do Mâconnais, na Côte d'Or, onde sua tia, Yvette Bérard, que morava num claustro beneditino, na Île Barbe, em Lyon, tinha vinhas e vinhas a perder de vista.
Já viu que responsa? Quanta honra pra mim, um pobre apaixonado por assuntos gastronômicos... Acho que mereço.

Cheguei em casa, li atentamente as instruções. Entendi que poderia dividi-la em duas parte (uma para vinagre branco e outra para tinto...)
Com muito carinho coloquei uma metade num recipiente e reguei com um belo chardonay da Borgonha e com a outra, arrisquei um vinho da casta baga, um Luis Pato de Portugal.

Querida Maria J.,
Espero que em breve, o rico "bouquet" que se espalhará pela minha cozinha, seja a inspiração para uma bela salada a ser temperada com o próspero vinagre que voce me proporcionou... E que compartilhemos ao redor de minha mesa.
merci beaucoup

Alain G.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Paul, Alex, Dalva e Dito... Maybe I'm Amazed?

Fui parar em São Paulo por conta do show do Paul McCartney.
Havia prometido a mim mesmo, desde que comprei o ticket em 1990, quando Paul veio tocar pela primeira vez no Brasil, que o dia que ele voltasse por essas bandas com sua banda, eu estaria lá, na platéia reforçando o coro das músicas que fazem parte da trilha sonora da minha vida.
O que aconteceu na época, foi que fiquei com o ticket na mão e não pude comparecer ao concerto. Estava em plena tour com uma famosa banda brasileira, na função de tecladista, quando inventaram de marcar um show no interior de Minas Gerais no mesmo dia. C'est la vie... Primo lavoro, como diriam os franco-italianos.
paul cantando live and let die
Mas "Hey Jude's" à parte, o papo aqui é gastronomia, e como já estava em São Paulo, fui conferir o novo restaurante de outro ídolo meu: o chef Alex Atala.
Acompanho Atala desde muito tempo. Não tanto tempo quanto acompanho Paul e os Beatles, até porque Atala nasceu em 1968, ano em que os rapazes de Liverpool já estavam as voltas com meditações trancedentais na Índia ao lado do polêmico Maharishi. Portanto, eu tinha onze anos quando Atala nasceu, já que eu nasci em 1957 e se me lembro bem, minha meta nesse ano era pedir um dinheiro ao meu pai para comprar um disco chamado "Sgt Peppers Lonely Hearts Club Band".

Mas não vou ficar aqui falando do ano de 1968, da Swinging London, nem do album branco (que foi gravado nesse mesmo ano...) e sim de toalhas brancas e talheres prateados.
Já gostava muito do Dom, seu premiadíssimo restaurante, e quando soube que Atala andava às voltas com uma nova casa também em São Paulo, focada numa comida bem brasileira, pensei: next time in Sampa eu estarei lá, assim como havia prometido estar no próximo show do dono da cadela Martha (my dear...) no Brasil.
a cozinha
E o destino aproximou Paul, Alex, Dalva e Dito, pois mr McCartney não veio ao Rio dessa vez, o que me fez ir à São Paulo, coisa que sempre me agrada pela real abundância de ótimos restaurantes.
O cardápio é realmente muito interessante e o ambiente ultra clean com mucho bom gosto.
Mme Flottante escolheu a moqueca capixaba, o que eu achei uma boa idéia. Estava deliciosa. Gosto muito desse prato quase que principalmente por causa do pirão... Amo um bom pirão, e é claro que no D e D não poderia deixar de ser maravilhoso. Gostei de ver o garçon despejando gentilmente a farinha de mandioca no caldo de peixe, enquanto mexia com a colher na panela de barro, numa linda performance para a execução do bendito pirão.
pirão de peixe
Parti então para o bife à milanesa (crocantíssima milanesa... das melhores que já comi) que normalmente viria acompanhado de uma salada de batatas, mas pedi pra trocar pelo pure de batatas, que vem a ser outra coisa que quando bem feito eu choro, como se estivesse ouvindo "Yesterday" live.
O bife vem em quantidade bem generosa mesmo (como reza o cardapio...) o que me forçou a pedir um pouco mais de pure (no que me atenderam muito cordialmente..) pra que parte da carne não se sentisse só, sem acompanhamento no prato, tamanha delícia estava o bendito e devorado pure.
bife à milanesa
bacalhau do seu dito
Gostei de saber também o porque do nome... Estrela Dalva e São Benedito, padroeiro dos cozinheiros.
Mlle Clair de Lune me surpreendeu quando disse ao garçon que gostaria de conhecer o Bacalhau do Seu Dito (uma linda posta do peixe assado com mini legumes, ovo caipira, azeitona, azeite e alecrim). Não é que ela raspou o prato? Fiquei surpreso pela segunda vez por conta desse fato, pois ela anda um tanto  assim, digamos,  meio sem apetite por conta de uma nova paixão... Maybe I'm Amazed?    
                                                                                                                                                                       Dalva e Dito
rua Padre João Manuel 1.115, Cerqueira César, São Paulo
tel: 55(11)3068-4444

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Ze Kitchen Galerie, Paris

Essa vida de gourmand não é mole não. 
Hay que ficar antenado... Principalmente quando se trata de uma cidade como Paris.
Outro dia mesmo, num papo com Chico Buarque perguntei:
_Chico, qual o bistrô que você gosta de frequentar em Paris?
_Olha, eu gosto de sair andando e entrar em qualquer um... algum com uma cara simpática.
_Hum... Funciona. Até porque, é difícil comer mal por lá, né?
_É, até acontece as vezes, mas geralmente a gente acerta.
Bem, papo vai e papo vem, consegui finalmente a informação que queria do nosso querido "brazilian blue eyes"(ou seriam "green eyes"?), resposta:  L'Ami Jean Bistrot.
Puxa, esse é um dos cinquenta e nove bistrôs da lista que acabara de levar pra conhecer em Paris.
Isso mesmo. Cinquenta e nove... E todos com suas devidas informações sobre o que pedir e tudo o mais.
Levando em conta que minha estada na cidade teria a duração de cinco dias (!)... Bem, não sou bom em matemática mas minha calculadora me diz que eu teria que comer em onze ponto oito bistrôs por dia.
Meu estômago não aguentaria, muito menos meu bolso.
Pois é, vida dura essa de gourmand.
Fiz então uma seleção de cinco deles que eu não poderia deixar de ir, e entre eles estava o Ze Kitchen Galerie.
Essa foi uma dica do meu amigo Carlos Eduardo Pinho, que vem a ser o diretor de comunicação Michelin da América do Sul... É bom ter amigos do ramo.
E Cadú acertou em cheio.
O lugar é muito interessante. Decoração moderna e de muito bom gosto, ambiente maravilhoso e muito bem frequentado (pessoas bonitas...) e uma comida feita por um chef de primeiríssima, William Ledeuil.
Ledeuil consegue dar um toque sutil de tailandia e especiarias do oriente com muita propriedade e bom gosto.
Frescor, essa é a palavra. Produtos da estação, tudo com aquela cara de que foi colhido na horta.
Mme Flottante ficou animada. Escolheu tão rápido seu prato (bouillon thai, poulpe, crevettes, gingembre confit...) que fui obrigado a eleger o vinho (Chablis Grand Cru...) com muita firmeza pra não ficar pra trás.
bouillon thai
cabillaud de ligne
Prato e vinho de madame escolhidos, aproveitei o Chablis (eu sou prático...) e parti tranquilamente pra minha escolha: cabillaud de ligne, vinagrette kalamenji, jus d'un curry thai.
Ambos pratos divinos... E fui feliz na escolha da ampola, o Chablis foi mesmo uma ótima ideia.
A sopa de castanha foi a primeira coisa que me chamou a atenção nos desserts. Conferi e gostei mucho.
sopa de castanhas
Monsieur Ledeuil é mesmo um craque.
Saímos de lá na disposição de uma caminhada... Estávamos a poucos passos do Sena.
Nada como a brisa da noite na cidade Luz.

Ze Kitchen Galerie
4, rue des Grands Augustins 75006
te: (01)4432-0032
métro: Saint Michel e Odéon

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Le Lutrin, Avignon...Ten Years After

hotel d'europe, Avignon
Voltar à Avignon depois de dez anos é uma indescritível felicidade.
Quando eu e Mme Fottante resolvemos incluir Avignon no roteiro dessa viagem à Europa, não tive duvida: Hotel D'Europe. Esse é daqueles que você de sente em casa (mesmo indo uma vez a cada dez anos...).
É chique, sem duvida... Chique no sentido real da palavra...O chique verdadeiro, sem excessos de informação visual...Coisa do velho mundo, com muita propriedade e bom gosto.
O cafe da manhã é um must. Nada de champagne no balde, acho isso meio over pro horário em questão (e olha que eu gosto do produto...), mas o croissaint, os queijos, o oeuf à la coque et ses mouillettes, o yogourt (!!) tudo de grande qualità.
oeuf à la coque 
Bem, mas e o Le Lutrin?
Descobri esse restaurante passeando pela cidade velha de Avignon contados dez anos atrás.
Na época, o frio era mais intenso (ah.. o mistral.. brrr..). Avistamos o Le Lutrin e nem pensamos duas vezes...Cardápio na máo, a soup à l'oignon parecia implorar por mim e por Mme Flottante, fiel companheira da vida e das mesas.
O vinho foi sugerido pelo garçon: cotes du Rhone, Domaine de la Presidente 1997.
Pura poesia... O vinho e a sopa.
soup a l'oignon, Le Lutrin
A sopa de cebola é um exemplo da genialidade dos franceses: pão dormido, queijo e um belo caldo de carne... Aquele caldo profissional. Tudo muito bem aproveitado por um povo que passou por duas grandes guerras e leva a sério a arte do piano a gás.
Bem, dez anos depois, aqui estamos... Eu e Mme F. no mesmo Lutrin com a mesma sopa e o mesmo vinho (dessa vez uma safra de 2007...).
hotel d'Europe
Tudo igual... Bem, emoções à parte, depois de alguns goles, o piano de Maurice Ravel parecia soprar em meus ouvidos melodias de um modo dórico na altura de mi bemol.
Será que o compositor do Concerto Pour la Main Gauche esteve por aqui se deleitando com a soup à loignon? Peut-Être... Qui sait num mistral de 1905.
Impressionniste...

Le Lutrin
3, Place du Palais 84000 Avignon