bE mY gUesT

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Insensé, Still 'Bout a Goose in Toulouse

Durante muitos anos o livro "Um Ganso Em Toulouse" foi uma espécie de referência nas minhas investigações gastronômicas na França. 
Escrito pelo jornalista americano Mort Rosenblum, de alma francesa adquirida pelo tempo que morou nesse país, "A Goose in Toulouse" (título original...) me levou a lugares do interior da França (que provavelmente eu nunca teria ido...) como a pacata cidade de Pont-l'Évêque, que produz um queijo de mesmo nome, apenas para jantar num restaurante, o inesquecível L'Aigle d'Or. 
O queijo Pont-l'Évêque, cuja textura é parecida com o famoso brie porém com um toque de avelã, eu já conhecia (e gosto muito...), mas sinceramente nunca pensaria em passar uma noite numa cidade do interior da Normandia apenas pela fama de seu queijo. Mas fui, seguindo a dica do tal restaurante que Mort Rosenblum, com uma escrita bem descritiva e apaixonada, dedicou um capítulo de seu livro.
Sim, esse livro realmente me ensinou muito sobre os franceses e sua gastronomia e também me levou a restaurantes muito interessantes.
Um dia, no ano de 2008, recebi um convite pra tocar na cidade de Montpellier. Era o ano em que comemorava-se 50 anos da bossa nova e varios artistas, brasileiros e franceses participariam da "Bossa Nova Fête Ses 50 ans"... quanta honra, eu abriria o show com um piano solo. Uma grande felicidade mesmo, mas uma coisa logo me veio a cabeça quase que simultaneamente ao convite: Os irmãos Pourcel.
Jacques e laurent Pourcel são dois chefs, irmãos gemeos, que abriram em 1988 na cidade de Montpellier um restaurante chamado Les Jardin des Sens. Em 1998 já estavam devidamente classificados com tres estrelas do guia Michelin.
Como eu sabia disso? Mais uma vez, o livro do Rosenblum.
Estrelas Michelânicas a parte, fazia tempo que eu sonhava em conhecer o trabalho desse duo de irmãos.

Reservei uma mesa... Mas não imaginava que os compromissos que envolviam o show (sound check etc...) no dia anterior do evento se estendesse tanto o que me levou a cancelar minha reserva. O trabalho em primeiro lugar...
Mas, "ha malas que vão pra Belém", e foi aí que eu fui parar no Insensé.
Insensé é um restaurante um pouco mais despojado, digamos assim, com um preço mais "agradável" e pilotado pelos mesmos irmãos do Jardin des Sens cuja comida é coisa sempre muito séria.

Mme Flottante, fã de carteirinha do Insensé desde então (temos voltado anualmente pra tocar...), dessa vez em 2010, começou os trabalhos com um crème brûlée de foie gras aux figues, mélange de jeunes pousses à l'huile de noix... Uma mulher que pede uma coisa dessas só pode mesmo ser muito fina.
Eu, diante de tanta finesse de CamÎle Flottante, pulei a entrada e parti pra grosseria: poitrine de veau braisée et caramélisée au miel épicé, écrasée de pomme de terre aux cébettes... a carne desmanchava de tão macia... délicieux.
Mme Flottante seguiu com um tartare de boeuf classique assaisonné par nos soins, pommes frites, salade.

Dividimos a sobremesa. La poire vigneronne aux amandes, glace au miel.
Momento tenso... Não é todo dia que nos deparamos com uma coisa dessas.


39, boulevard Bonne Nouvelle
34.000 Montpellier, France
tel: 33(0)4 6758-9778



quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Um Outro Alain...

Alain Ducasse... Esse fez escola mesmo, literalmente. Sua École de Cuisine em Paris está pra gastronomia, assim como a Berklee College of Music para a música... Duas artes, duas escolas. Ambas de alto nível.
Já estou de olho nele faz tempo. Afinal, não é a toa que um chef consegue chegar à uma constelação de catorze-estrelas, my deep respect.
Além do mais, Alain Ducasse é um empresário de mão cheia, pois orquestrar 21 restaurantes onde trabalham 1.400 pessoas pelo mundo, não deve ser muito fácil. Só em Paris são 10 casas sob sua batuta.
Eu venho evitando os famosos restaurantes estrelados pelo guia vermelho Michelin (duas e três estrelas...) porque, numa cidade como Paris, a gente não precisa pagar por talheres de prata nem por toalhas de linho e muito menos aturar garçons esnobes pra comer bem.
Abro algumas exceções, vindas de dicas de amigos etc... Geralmente me arrependo. Mas veja o que eu ouvi, de um chef importante e erudito no assunto: "Na França, em geral, vale a pena conhecer os restaurantes que tem apenas uma estrela pois a equipe estará dando todo o combustível pra conquistar a segunda estrela. Não são caros e a comida sempre maravilhosa..."
Foi com isso na cabeça que no ano passado eu fui conferir o Aux Lyonnas (espetáculo!!) e dessa vez fui parar no Benoit, outro bistrô "Ducasseano" com apenas uma etoile.
Mme Flottante, uma séria apreciadora de cassoulet, se esbaldou. Claro, no Benoit tem um dos melhores de Paris... é um dos orgulhos da casa.
Dizem que a primeira impressão é a que fica... Pois bem, os aspargos que pedi na entrada (primeira foto lá em cima..) marcaram à ferro na minha memória a imagem do Benoit. Os gougères, aqueles pãezinhos de queijo franceses (de queijo Gruyère, derretem na boca...), também ajudaram muito a concretizar esse fato.
Enquanto Camîlle se deliciava entre as brancas favas de feijão que envolviam a suculenta carne de pato em seu prato, eu esquecia do mundo por conta da seriedade do Joue de Boeuf d'Aubrac, que vem a ser a bochecha do boi, uma carne de textura tão tenra que dispensa a utilização da ferramenta cortante oficial, a faca (e o molho?!)
Dividimos uma torta de limão que, exposta à dois metros de distância da nossa mesa, parecia me encarar durante todo o almoço... A vida, ao menos em Paris, tem seus momentos corretamente doces...

Benoit
20, rue Saint-Martin 75004, Paris
tel: (01)4272-2576
métro: Châtelet

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

"Meus Chefs Preferidos", Frédéric De Maeyer

Você já ouviu falar em piano a gás?
É uma expressão usada pelos chefs franceses quando se referem com uma peculiar intimidade ao fogão.
Eu "vesti a camisa" dessa expressão. Já virou até o futuro nome do meu livro (ou o nome do meu futuro livro...).
Achei "a minha cara"... Sou pianista e adoro me arriscar nas artes do forno e fogão, então já é.
Quando ouvi meu amigo, cantor e compositor (e também ótimo cozinheiro...) Paulo Da Luz, morador da cidade de Nimes, contar essa história do piano a gás, agradeci no ato... Sem querer, ele acabara de batizar o título do meu futuro livro... Em grande estilo.

Esses artístas do "piano a gás" merecem todo meu respeito. São como compositores e instrumentistas, sabe? Eles criam pratos que devem ter harmonia e bom gosto (nos dois sentidos...) e executam diariamente esses pratos, como um pianista num concerto que se joga na música, aplicando suas técnicas e toda sua emoção a cada dia.
Então, my deep respect pra esses geniais artístas que nos proporcionam tanta alegria e prazer.
Pra começar essa nova série "meus chefes preferidos", vou homenagear um chef de altíssimo nível, um grande artísta e amigo, monsieur Frédéric De Maeyer.

Tive o grande prazer de conhecer Fred (acho que posso chama-lo assim...) quando fui pela primeira vez almoçar no restaurante Eça, no centro do Rio.
O restaurante fica no subsolo de uma loja da H. Stern, descendo por uma charmosa escada em espiral.
Não preciso nem dizer que a partir daquele dia, virei um habitué.
O restaurante Eça é sem dúvida um dos melhores do Rio de Janeiro e Fred, que comanda o "piano a gás" da casa, não deixa a peteca cair, nunca.
Muito criativo, Fred ao mesmo tempo que mantém seus clássicos no menu, nunca para de se renovar, sempre "inventando" novas preciosidades.
Aparece com 'surpresinhas" criadas na hora, coisa de mestre, de um artísta que precisa sempre se expressar da melhor forma possível com sua arte.

A linda foto abaixo, tenho que admitir, roubei da internet.
Não tinha crédito, mas gostei muito. Vou usando aqui até clicar eu mesmo uma outra foto da equipe do Eça para substituí-la (espero que o autor não me processe... pardon)
Fred, Deise e Nina numa foto roubada da internet.
Camîle Flottante concorda comigo em gênero, número e grau.
O Eça é o tipo do restaurante que a gente logo pensa, naquele dia especial, quando queremos comemorar alguma coisa, ou simplesmente quando queremos comer bem... Especialmente bem.
Antes da minha recente viágem pra Europa, resolvemos almoçar lá.
Devo dizer também, que o Eça é um pacote de felicidades.
A Deise Novakoski, sommelier (e amiga desde os tempos do Mistura Fina na Lagoa..), faz parte do time da casa, assim como a Nina Ramos, nossa querida amiga que comanda o salão com muito estilo e competência.
Somos tratados a pão-de-ló, como diria minha avó.

Mme Flottante começou com uma linda salada criada na hora pelo chef: chèvre, figos, palmito e brioche.

Pra mim, Fred preparou um foie gras sobre mousseline de grão de bico e cogumelos paris (de chorar de bom...)

Camîle, que andava faminta, seguiu com um cherne com pure de baroa (um clássico do Eça)

Meu prato principal: um liguine na tinta de lulas com frutos do mar criado na hora pelo chef... A foto abaixo explica melhor.

Não quero (e nem devo...) parecer simplório nas minhas tentativas de definições dos pratos do chef.
Importante ressaltar que, quando eu falo "linguine na tinta de lulas com frutos do mar", eu não menciono o molho, que pra mim, é de grande importância (quanto mais feito pelo Fred...). Mas será que eu teria competência pra descrever um molho do chef De Maeyer? Acho que não, portanto, me perdoe caro leitor, mas procure "entrar" na fotografia" e imagine você mesmo... Como se estivesse apreciando um quadro de Matisse num museu de Paris, ou melhor, de alguma cidade da Bélgica, país que generosamente nos presenteou com o Frédéric De Maeyer.

Eça
av Rio Branco, 128. Centro, Rio de Janeiro.
tel: (21)2524-2401 e 2524-2399